“Vitor e sua deficiência: um obstáculo? “
postado em 31 jan 2008


    Certo dia, brincando com Vitor pela janela de seu túnel – do qual ele adora – percebi que ele estava incomodado com alguma cosia. Não sabia se eram os pedreiros da obra da frente, ou o barulho da betoneira. Com o passar do tempo percebi que o problema era uma mutuca. Ela o rodeava há algum tempo e ele não conseguia se livrar da mesma. Em um momento, ela pousara em sua mão direita (apenas para lembrar, Vitor não tem o braço esquerdo) e ele, cuidadosamente começou a erguer a mão em direção a sua boca, na intenção de caçá-la. Chegando bem perto, ele deu o bote, sem sucesso. Olhou para mim como se pedisse ajuda e eu ajudei. Disse que eu iria matá-la para ele na próxima vez que ela pousasse nele. Instantes depois a mesma mutuca parou em sua perna e Vitor permaneceu parado, desviando seu olhar apenas para mim como se dissesse ?pode pegá-la, eu estou parado esperando você agir?. E foi isso que fiz. Vitor ficou muito contente por ter se livrado dela e voltou a brincar comigo no túnel como sempre faz. Mas durante a brincadeira, outra mutuca. E dessa vez Vitor nem tentou pegá-la, olhou direto para mim e permaneceu estático até que eu desse um peteleco no inseto.


    Não diria que essa deficiência física é um limitante para Vitor, afinal, no dia-a-dia o vemos agindo normalmente, mas claro, em algumas situações apresenta certa dificuldade. Tanto que para que ele usufruísse seu cesto e sua plataforma no recinto cercado, foi-lhe construído uma escada especial, com proteção de corpo ? similar àquelas que vemos em caixas d?água altas ? e corrimão especial para seus membros. Vitor já subira na plataforma sem o auxílio dessa escada, mas com dificuldade em função de sua deficiência. Com essa escada, o acesso ficou mais fácil e, conseqüentemente, suas subidas ao cesto estão mais freqüentes, possibilitando uma visualização mais abrangente do Santuário e dos demais chimpanzés. No caso das mutucas, Vitor teria conseguido a captura delas, com certeza, mas como percebeu que poderia ser auxiliado, não pensou duas vezes, provando que a inteligência desses primatas é tão grande quanto a nossa. Afinal, quem nunca pediu ajuda para acelerar a resolução de um problema, mesmo sabendo que seria capaz de resolvê-lo sozinho?


Luiz Fernando Leal Padulla
Biólogo
Santuário GAP/Sorocaba
Notícias do GAP 31.01.2008