Nós que dedicamos a nossa vida à proteção da Biodiversidade, estamos acostumados a sofrer, já que muitos animais que tentamos salvar terminam sofrendo e morrendo em nossos braços. A dor de ver morrer ou sofrer um grande primata é algo que entra fundo no coração e deixa seqüelas, e terminamos nos revoltando com a inconsciência da humanidade e da sociedade em que vivemos. Porém, a morte de um filho humano, inesperada e fulminante, é algo diferente, para a qual nunca estamos preparados.
No dia 28 de junho, um dia qualquer, essa tragédia nos tocou. Entramos no apartamento dele, e o achamos caído no chão e morto de um infarto fulminante no miocárdio, que a idade de 41 anos que ele tinha, não dá possibilidade de assistência. As lágrimas já derramadas por muitos animais, e grandes primatas em minha vida, desta vez, voltaram para expressar a imensa dor de perder um filho, no meio de sua vida.
A impotência de um pai frente a morte inesperada, acostumado a proteger, cuidar, aconselhar e preocupar-se pelo futuro de cada um dos 7 filhos que têm me acompanhado nesta vida, é algo difícil de descrever, e nunca pensei que passaria por essa prova.
No mesmo dia desta tragédia, o último grupo remanescente dos chimpanzés do ex-Circo Garcia partiam, e chegavam ao Santuário de Grandes Primatas de Curitiba. Aqueles que sofreram anos de isolamento, confinamento, privações, ganhavam um futuro, uma alternativa decente de vida, sem ser explorados, e seus filhos arrancados de suas mães para serem comercializados.
No dia seguinte, dia do sepultamento, os chimpanzés de Sorocaba esperavam por mim e eu não apareci. Foi um dia diferente naquele Santuário, um silêncio e uma apatia coletiva invadiu aquela comunidade, como pressentindo que uma tragédia tinha acontecido, e um irmão, este humano, tinha sido atingido. No dia 30, sábado, eu já estava desde cedo no Santuário. Eles perceberam em minhas reações, e minha face, que algo traumático tinha acontecido comigo. Guga veio e deitou em meu colo, bem cedo, Emílio me abraçou intensamente, eles sem saber o que era, estavam dando-me um conforto com gestos já que a linguagem não era possível.
O altruísmo dos chimpanzés, que alguns humanos ainda negam, para encobrir conceitos antropocêntricos irracionais, é muito maior que os dos humanos. Eles sabem sentir, ajudar, assistir, e sofrer junto com aqueles que são submetidos a alguma provação nesta vida. Meu filho Jorge, desde onde estiver o seu espírito, agora poderá sentir o que muitos humanos nunca experimentaram em vida.
Dr. Pedro A. Ynterian