Daniela Jacinto
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O chimpanzé Black, que vive no Parque Zoológico Municipal Quinzinho de Barros há cerca de 40 anos, está sendo alvo de uma campanha para que passe a viver no Santuário dos Grandes Primatas, também situado em Sorocaba. A iniciativa é de Pedro Alejandro Ynterian, proprietário do Santuário, que tem divulgado na internet diversos textos pedindo a quem simpatizar pela causa para enviar e-mail para o prefeito Antonio Carlos Pannunzio, manifestando interesse em que o animal vá para o santuário. A Prefeitura informa que é sensível à causa e que Pannunzio irá estudar o pedido. Para isso está sendo elaborado um laudo técnico a respeito de como tem sido a vida de Black no zoológico.
O principal apelo da campanha é para que o chimpanzé não fique sozinho em sua jaula, já que até 2011 vivia com sua companheira Rita. Ynterian afirma que os chimpanzés precisam de socialização. Também diz que Black fica em um pequeno recinto no zoológico.
Conforme Ynterian, Pannunzio tem em suas mãos um pedido do santuário e do filósofo australiano Peter Singer, fundador do projeto GAP (sigla de Great Ape Project; em português, Projeto dos Grandes Primatas), feito quando visitou o santuário de Sorocaba, no ano passado. A campanha tem contado com o apoio do ex-vereador de Sorocaba e ambientalista Gabriel Bitencourt, que publicou um texto a respeito em seu blogue, no dia 10 de novembro. Os relatos de Ynterian e de Bitencourt têm sensibilizado as pessoas e com isso a campanha tem se espalhado pela internet.
Apelo do Santuário
Pedro Alejandro Ynterian, responsável pelo GAP, afirma que se preocupa com Black porque os chimpanzés não suportam a presença do público, o estresse que o público gera. “Essa vida que Black leva é miserável para ele, que está na velhice e precisaria de um lugar onde tivesse companhia e sem público. A maioria dos chimpanzés de zoológico tem perturbações mentais. Inclusive recebi um, há 10 anos, do mesmo zoológico, porque ele não conseguia sobreviver lá, o Caco, que se automutilava”, afirma Ynterian.
Ainda de acordo com o proprietário do Santuário, as informações que obteve sobre o Black, vindas de pessoas que trabalharam no zoológico, é que é infeliz lá dentro. “Ele odeia o público, quer viver tranquilo, mas lá não pode porque é um local pequeno. E ainda tem pessoas que sempre vão perturbar ele. No Santuário, nosso menor recinto tem mil metros quadrados”, argumenta.
Ynterian explica que nenhum outro animal sofre com a presença do público, mas o chimpanzé sim. “Quando o animal não tem essa percepção, ele não liga, mas o chimpanzé é um ser inteligente e se sente agredido. É uma tortura para ele, que não tem sentido”, comenta.
O proprietário do Santuário lembra que quando recebeu Caco, teve de administrar o medicamento Prozac (antidepressivo) durante quatro anos. “Consegui uma fêmea para morar com ele e hoje Caco é mais tranquilo. Normal nunca será, porque as doenças da mente não conseguem ser erradicadas, então tenho de mantê-lo em isolamento, no entanto ele sabe que está rodeado de outros chimpanzés e não de humanos”, diz.
Para Ynterian, manter Black no zoológico é uma vaidade dos dirigentes daquele local. “Isso acontece porque acham que o chimpanzé atrai o público. Nós, do Santuário, somos contrários a zoológicos com visitação pública. O zoológico pode cuidar, dar todo o tratamento que quiser, mas a única forma de mudar é que fechem à visitação e se tornem um refúgio para os animais, para se sentirem em seu habitat.”
O ideal seria, para Ynterian, transformar todos os zoológicos em centros de resgate. “Se alguém disser que Black é feliz no zoológico, eu paro de fazer a campanha.”
Prefeitura analisa pedido
Rodrigo Maldonado, secretário-chefe do Gabinete do Poder Executivo, e João Leandro da Costa Filho, secretário de Governo e Segurança Comunitária, concederam entrevista a respeito da campanha. Ambos afirmam que essa é uma questão complexa, e que é preciso inclusive consultar o departamento jurídico da Prefeitura para saber o que a lei diz a respeito, se é possível fazer essa transferência.
João Leandro disse que o prefeito pediu um estudo técnico sobre o assunto e irá analisar a situação com cuidado, visando a boa condução desse processo. “Se for comprovado que o melhor para o Black é ir para o Santuário, não tenho dúvida de que o prefeito é sensível à questão e irá aprovar. Temos de pensar no bem-estar do animal, então essa é uma discussão saudável”, comentou.
Questionado a respeito de Caco, que no passado foi enviado para o Santuário, o secretário de Governo respondeu que trata-se de um caso específico. “Caco pertencia a uma família que o rejeitou e já veio para Sorocaba com problemas, tomando Prozac”, explica. João Leandro lembra que o zoológico municipal é referência mundial e que também trabalha na recuperação de animais. “Foi inclusive gravada uma série a respeito, que está sendo exibida no programa Animal Planet, da Net”, ressalta.
Sobre a questão do animal ficar exposto ao público, João Leandro lembra que há um espaço para ele ficar afastado das pessoas quando assim desejar. “Por outro lado, especialistas dizem que se ele estiver estressado, ele não consegue ir para lá, ele fica como se estivesse tentando se defender.”
Conforme a Secretaria do Meio Ambiente (Sema), apesar de estar sozinho neste momento, não há indícios de que a ausência de outro chimpanzé tenha alterado a qualidade de vida de Black. “Assim acreditamos que ele pode ficar só”, diz em nota o órgão municipal. Mesmo assim, a equipe do zoológico está pesquisando e consultando a possibilidade de receber fêmeas de chimpanzé no Brasil e no exterior.
A Sema disse ainda que o recinto de Black é espacialmente bem dimensionado – são 260 metros quadrados de área útil – e que apesar do chimpanzé ser uma espécie social, existe uma grande variabilidade entre os indivíduos. “De forma similar aos primatas humanos, existem indivíduos que ficam bem sozinhos e os que preferem ter outros por perto, ou seja, a história de vida de cada indivíduo tem que ser levada em consideração. Além disso, os indivíduos se adaptam às diferentes situações durante a vida”, argumenta o órgão municipal.
Black, conforme informações da Sema, vive bem no zoológico. “O animal tem os pré-requisitos de manutenção de chimpanzés em cativeiro atendidos, entenda-se por isso recinto com complexidade estrutural e cognitiva, com pontos de abrigo na área de visitação e fora dela, dieta equilibrada, funcionários treinados para o seu manejo, contato diário com tratadores, tratamentos profiláticos, enriquecimento ambiental, entre outros cuidados.”
O órgão municipal ainda afirma que Black não apresenta comportamentos considerados anormais, como automutilação ou movimentos repetitivos. “Pelo contrário, ele interage com o ambiente (escala troncos, sobe na plataforma, observa o entorno, utiliza o cupinzeiro, rede, explora todas as áreas do recinto), com o tratador e com o público, considerando a idade avançada dele (aproximadamente 50 anos).”
Notícia publicada na edição de 07/12/14 do Jornal Cruzeiro do Sul, na página 010 do caderno A – o conteúdo da edição impressa na internet é atualizado diariamente após as 12h.
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