Entre os chimpanzés que vivem no Santuário hoje, existem aqueles que vieram de circos e de zoológicos. É fato que em ambos as situações, quando não adequadas e respeitando às necessidades desses grandes primatas, o estresse vivido por eles é imensurável. Há também outras formas de traumas vivenciados no passado pelos chimpanzés, podendo ser o trauma físico e o psicológico. Mas afinal, qual é o pior? Pode até parecer bonito e espontâneo um chimpanzé usando roupas, penteando seus próprios cabelos ou gesticulando obscenidades. O que não é nada bonito e agradável é a maneira como eles vieram a fazer isso. Sem entrarmos no mundo obscuro de circos e tratadores que (mal)trataram esses primatas, não saberíamos que para tanto, muita dor física foi necessária. Choques, espancamentos e até mutilação são alguns desses artifícios insanos para o “grande espetáculo”.
Mas não podemos desconsiderar, também, os traumas psicológicos rotineiros em circos e em alguns zoológicos. Pesquisadores, cientistas e especialistas já disseram que “um chimpanzé sozinho não é mais um chimpanzé”. E ainda assim, vemos que o isolamento e solidão ainda são freqüentes em zoológicos do país, como o lamentável exemplo do Parque Ecológico de Americana (SP), que aprisiona o chimpanzé Alemão há mais de 15 anos em uma minúscula e pobre ilha. Mas não precisamos ir tão longe para comparar o estrago que muitas dessas instituições, tidas como fontes de educação ambiental (que educação?), fazem com os primatas. No Santuário temos o caso de Pongo, que veio de zoológico. Hoje, com 22 anos, Pongo ainda apresenta problemas psicológicos em conseqüência da separação de sua família. Nascido num zoológico, viveu com sua família por cerca de 15 anos, sendo separado em 2000 para ser enviado a outro zoológico particular em Fortaleza onde, claro, não se adaptou. Neste exemplo é nítida a falta de sensibilidade de muitas pessoas que tratam essas “pessoas não-humanas” como simples objeto ou mercadoria de troca. O que falar de chimpanzés que estão constantemente expostos a barulhos, gritarias e provocações de visitantes, sem opção de se esconderem ou evitar tais absurdos?
Assim, quando tentamos definir qual tipo de trauma é pior, podemos chegar a conclusão de que os dois são piores. Vivendo a cada dia, compartilhando o tempo com nossos irmãos, sejam aqueles que vieram de circos ou aqueles de zoológicos, não é possível definir qual trauma é pior. Talvez nem eles, que sentiram na pele essas barbaridades, cheguem a esse consenso.
O único ponto em comum, que de fato podemos notar de forma generalizada entre eles, é a gratidão pelo carinho, pelo cuidado, pelo respeito e a feliz oportunidade de que hoje, enfim, eles podem realmente viver e descansar em um verdadeiro Santuário.
Luiz Fernando Leal Padulla
Biólogo
Santuário GAP/Sorocaba