(Reprodução de matéria publicada no The New York Times)
17/04/2007
John Noble Wilford
Em Chicago
Em uma pausa para almoço no simpósio “A Mente do Chimpanzé” em março, Jane Goodall me acompanhou numa visita à jaula dos macacos no zoológico de Lincoln Park. Ela soltou o grito rouco do chimpanzé para indicar nossa partida.
Jane Goodall chegou à África meio século atrás para observar e escrever sobre os animais
Não poderia haver uma guia mais autorizada. A Doutora Jane, como seus colegas a chamam, é a mais célebre primatologista de sua geração. Por isso foi como estar com um Leakey olhando para o crânio de um hominídeo na África oriental, com Neil Armstrong em uma espaçonave Apollo ou com Stan Musial no campeonato mundial.
Jane Goodall, então uma jovem inglesa sem experiência nem diploma universitário, chegou à África quase meio século atrás para observar e escrever sobre animais. Encorajada por Louis Leakey, um paleoantropólogo pioneiro, ela montou a estação de campo Gombe no que hoje é a Tanzânia.
Quase desde o início, em 1960, ela trouxe para a ciência e para o público uma nova compreensão do comportamento e da cultura dos chimpanzés. Em um espaço ao lado da jaula dos macacos, Goodall admirou a cena de chimpanzés grandes e pequenos descansando, coçando-se, mastigando alguma coisa ou saltando pelos galhos de árvores e cordas que simulavam cipós. “Lá está o macho alfa”, ela disse, imediatamente avaliando o elenco.
Uma autoridade do zoológico disse que o alfa tinha 16 anos e se chamava Hank. Ele estava deitado como um potentado superalimentado, relaxando na base de uma árvore de seus deveres como propagador da espécie. Não muito longe, em um galho de árvore, um macho de 7 anos chamado Kipper mantinha um olhar de adoração para Hank, seu modelo social.
“Os jovens machos escolhem um macho mais velho – não precisa ser o alfa – e o seguem e estudam tudo o que ele faz ou deixa de fazer”, explicou Goodall. “Faz parte de sua separação das mães.”
Ela descreveu suas primeiras experiências observando essas características sociais na natureza. No início, os macacos de Gombe fugiam sempre que ela aparecia. “Você pode imaginar o que era isso para eles”, disse. “Nunca tinham visto um macaco branco.”
Goodall decidiu observar os animais à distância, com binóculos. Ela disse que usava sempre as mesmas roupas e mantinha a mesma rotina, nunca fazendo uma abordagem que pudesse parecer ameaçadora. Depois de alguns meses sua paciência foi recompensada. Um macho mais velho, que ela chamou de David Greybeard [Barba Cinza], se aventurou em sua direção. “Eu mostrei uma banana e ele continuou se aproximando”, ela disse. “Ele era minha ligação com os outros, fazendo-me entrar em seu mundo.”
Logo Goodall viu outros chimpanzés quebrarem e modificarem pequenos galhos para “pescar” cupins e formigas de seus ninhos. Os seres humanos não eram os únicos que fabricavam ferramentas, ao que parecia. Ela também observou os chimpanzés saírem em viagens de caça, revelando que eles não eram totalmente vegetarianos e comedores de frutas. Também descobriu seus lados violentos.
“Os chimpanzés se parecem conosco de muitos modos”, disse Goodall.
Hoje ela tem 73 anos, seu cabelo louro está grisalho, mas ela ainda o amarra na nuca como na época de Gombe. Ela é magra e sorri muito com os olhos, lembrando a mulher das antigas fotos, na África profunda com um chimpanzé a seus pés estendendo-se para levantar a parte de trás de sua camisa cáqui.
Um chimpanzé chamado Fifi foi o último sobrevivente de seu grupo original na estação de campo. Os chimpanzés muitas vezes vivem 40 a 50 anos na natureza, e mais ainda em cativeiro. “Dois anos atrás perdi meu velho amigo”, disse Goodall sobre Fifi.
Um jovem chimpanzé no zoológico subiu aos galhos mais altos de uma árvore para mostrar sua perícia acrobática. Vários outros faziam seu descanso do meio-dia e um macho de bom tamanho mostrava um amplo sorriso, como se estivesse ensaiando para um comercial de televisão. Não, corrigiu Goodall, essa era apenas a expressão facial de um chimpanzé comendo.
Uma fêmea de alta posição, provavelmente a parceira preferida do alfa, acordou de uma soneca. Em outro lugar, duas fêmeas se estranhavam e o motivo de sua agitação era claro. As protuberâncias cor-de-rosa em seus traseiros anunciavam que estavam prontas para acasalar.
Goodall abandonou o trabalho de campo há alguns anos. Ela dirige o Instituto Jane Goodall e passa pelo menos 300 dias por ano viajando pelo mundo como defensora da conservação em geral e da proteção dos chimpanzés, cuja população está diminuindo.
A multidão no zoológico começou a aumentar. Era sábado, e pais e mães traziam seus filhos. Uma das mães reconheceu Goodall e se aproximou. “Oh, eu a admiro tanto, tudo o que a senhora fez”, ela disse.
A mulher puxou seu marido para conhecer Goodall, que deu um sorriso gracioso e lhes agradeceu pelo interesse por seu trabalho. Sendo a comunicação dos primatas como é, outros se aproximaram. Só as crianças ficaram em seus lugares junto à cerca, de olho fixo nos macacos.
Eu deixei a Doutora Jane com seu público admirador. Voltei para o simpósio para ouvir mais sobre o que os cientistas têm aprendido sobre chimpanzés desde que a jovem senhora inglesa, David Greybeard e Fifi se conheceram na África na década de 1960, e assim revolucionaram a primatologia.
Tradução: Luiz Roberto Mendes Gonçalves
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