Os sons do passado
postado em 13 jun 2014

Os sons vêm de diversas direções. Um som agudo de chimpanzé e a resposta de outros que denotam medo. Outros são mais estridentes, de várias vozes e de um tipo muito peculiar. A noite o som é diferente: o rugir de muitos felinos. Tôto, chimpanzé recém-chegado ao Santuário do GAP em Sorocaba , procedente do Zoológico de Leme, senta-se na porta do seu recinto para ouvir melhor e tentar identificar em sua memória o que lhe lembram aqueles sons.

Agora, talvez, entendamos porque Tôto ficou uma semana refugiado no lado mais escuro de seus dormitórios, sem sair. Ele pensou que estava sonhando. Aqueles sons o levavam a muitos anos atrás, em sua infância, quando morava no Zoológico Bwana Park, do Rio de Janeiro, hoje fechado pelo IBAMA por maus tratos aos seus animais.

Pelas últimas informações coletadas, tudo faz indicar que Tôto é filho de Peter e Tata, que moram a 500 metros dele, junto com a tia Judy e os irmãos Marcelino e Miguel, nascidos no Santuário.

Segundo nos contaram, Tôto apanhava do pai e de lá foi tirado, terminando no Zoológico de Leme, para acompanhar Gimba, chimpanzé fêmea que tinha ficado sozinha após a morte de seu companheiro Chicão.

Peter é um pai severo, talvez, até demais. Tem muito ciume de sua família com outros chimpanzés que moram perto. Anda aprontando com Jeber e Tyson, que moram na frente, e com Bongo, que mora do lado. Já teve encrenca com Martín, quando era seu vizinho, machucou a mão quando furou um bloco de concreto para brigar com o vizinho e levou uma mordida.

Tôto talvez se lembre mais do que nada dos gibões (Siamangs), que têm um grito peculiar e prolongado que se escuta até quilômetros de distância. O grupo de gibões do Santuário veio também do Bwana Park, exceto  um bebê que nasceu no Santuário. Eles moravam em frente à  família de Peter e perturbavam todos os vizinhos.

Tôto está em tratamento de uma possível úlcera estomacal sangrante, de índole emocional, após a morte de Gimba no Zoológico e por ficar sozinho.

Quando conseguirmos levá-lo a normalidade, então, quiçá, o aproximemos de sua família. Porém, não temos certeza se será reconhecido e se Peter o aceitará. Não sabemos que idade Tôto tinha quando foram separados. Poderemos criar um estresse ainda maior. Talvez, seja melhor para ele esquecer seu passado triste e turbulento e recomeçar uma nova vida com amigos que conhecer no Santuário, e que o procuram com curiosidade.

Das alturas do cesto de seu recinto, Pedrinho bate palmas para chamar a atenção do possível amigo. Tôto não liga para ele. Sentado na porta de seu dormitório, deixa fluir sua mente para longe, tentando identificar em suas recordações a gênese de seu passado esquecido.

Dr. Pedro A. Ynterian

Presidente, Projeto GAP Internacional

 

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