O real valor do dia das crianças
postado em 16 out 2007

Foi-se o tempo em que esperava ansioso o dia das crianças. Como não sou mais criança, há tempos só vivencio essa data com minha sobrinha, observando e admirando sua alegria com os presentes tão esperados – isso quando a data coincide com algum final de semana. Mas esse ano foi diferente e pude presenciar uma outra experiência, com crianças diferentes.

Em pleno feriado prolongado, estávamos lá, presentes no Santuário, não de maneira obrigada, mas por prazer de podermos estar com nossos irmãos. (Por sinal, aos finais de semana, quando nos dedicamos à nossa outra família e ao nosso descanso, parece que algo está nos faltando).

Tudo ia normal, até o momento em que parei para pensar e observar cada chimpanzé nesse dia. Foi quando me dei conta de que a grande maioria dos chimpanzés do santuário ainda era criança, assim como minha linda sobrinha de 10 anos. E hoje era o dia das crianças.

É certo que essa data tem um maior contexto comercial do que seu valor em si. Mesmo assim, ao contrário das crianças humanas que, inconscientemente são corrompidas pela ilusão mercantilista dos brinquedos e do consumo vendidos pela mídia, a alegria e a felicidade dessas outras crianças é muito mais pura e verdadeira. Não são precisos carrinhos modernos, bonecas que falam ou vídeo-games de última geração; para elas o grande presente desse dia foi a presença do Dr. Pedro. Afinal, não é sempre que uma data como essa coincide com sua presença.

Mais que um pai, Dr. Pedro também acaba por desempenhar o papel do macho alfa desse grupo todo. Mas com certeza o respeito e a admiração que ele tem de todos está muito além disso tudo. Muito mais além do que nós somos capazes de entender.

Nesse dia, comprovei de uma vez por todas o carinho que os chimpanzés tem com seu pai. Já era final do expediente, quando todos se preparavam para dormir. No novo recinto, muitos já tinham adentrado aos quartos, entre eles, Carlos, que aguardava Guga para fazer-lhe companhia. Mas Guga, o filho primogênito, relutava em atender aos chamados do tratadores, agindo com indiferença, divagando sentado na rede. Os tratadores já estavam ansiosos em ir embora e pediram minha ajuda. Em vão. Só me restou a alternativa de buscar a ajuda do Dr. Pedro. E foi incrível. No que ele entrou no corredor do recinto, todos o recepcionaram de forma calorosa e barulhenta, mostrando alegria ao vê-lo novamente – já que durante o dia ele já os visitara algumas vezes.

Sem falar uma única palavra, Guga veio em sua direção e, de maneira mágica, eles conversaram somente com o olhar. Tudo bem que Guga não entrou, mas que houve um acordo, um diálogo real – ainda que mudo! -, disso eu não tenho dúvida. Bastou um olhar para que eles se entendessem. E, atendendo ao pedido de Guga, o quarto ficou aberto para que ele pudesse entrar depois.

De fato, as verdadeiras palavras não precisam ser ditas, basta saber expressá-las.

Essa alegria pelo carinho que lhes é dado pode não ter muito sentido para humanos, que preferem bens muito mais concretos. Porém, dando-nos mais uma lição de vida, essas crianças provaram que não há valor no mundo que substitui o amor e o carinho. Será que em nosso mundo ‘racional e superior’ ainda vemos valores como esse?

Luiz Fernando Leal Padulla
Biólogo
Santuário GAP/ Sorocaba