Macacos nos mordam!
postado em 09 maio 2011

Eles são quase iguais a nós, se olharmos através do mapa genético. Os chimpanzés, para o bem ou para o mal (deles), carregam cerca de 96% do DNA dos humanos. E, no entanto, os desembargadores que avaliaram a transferência de Jimmy do zoológico de Niterói foram categóricos: macaco não é gente!

Quem mandou, pergunto, recorrer à Justiça dos homens para julgar uma questão tão delicada? E tão alheia aos mecanismos estabelecidos nos códigos da nossa espécie. Os ambientalistas que defendem a mudança do macaco para uma reserva ecológica em Sorocaba basearam-se num conceito pouco palpável – a felicidade do bicho. Deduziram brilhantemente que ele está infeliz num espaço exíguo, solitário e longe de seu habitat natural.

O melhor seria recorrer à sabedoria do rei Salomão, que rapidamente decidiria que o melhor é cortar Jimmy em duas metades – uma fica na jaula do zoo, outra vai para o santuário. Quem primeiro reagisse a tal veredicto estaria do lado justo, o do bem-estar de um espécime que tem 27 anos, ou seja, apenas metade da expectativa de vida de um chimpanzé em cativeiro.

Além de extremamente inteligentes e capazes de aprender centenas de palavras da nossa língua (seja em qual idioma for), eles são animais artísticos, aptos a pintar lindas telas coloridas. Sem contudo abrirem mão de uma enorme agilidade, seja nas quatro patas, seja na postura bípede. Em suma, são os melhores em dois mundos. Para complementar, apresentam a quem conseguir se interessar um olhar doce e compenetrado, sempre disposto a tentar compreender o que estamos lhe pedindo que façam.

No dialeto africano bontu, chimpanzé quer dizer aproximadamente “falso homem”. Foi por se deterem nas pequenas diferenças e não nas enormes semelhanças que os homens responsáveis por esse julgamento decidiram reiterar a prisão do primata. Sem lhe dar chance de ao menos dizer o que prefere.

Não se imagine que Jimmy esteja alheio a tudo isso. Ou conformado com sua condição. No plano da intuição animal, ele com certeza percebe que está à beira de uma possível grande transformação. E torce, também numa esfera afastada do pensamento, para que a raça humana não repita o erro que vem cometendo há milhares de anos, com milhares de animais: o de se dar o direito de lhes tirar a liberdade – o bem maior que possuem. E sobre o qual ninguém deveria ter nenhum domínio.

Fonte:
Jornal Folha de São Paulo, Cotidiano C9, 07/05/2011

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