Esta história se inicia há mais de três anos, ou talvez podemos estender sua origem a mais de 10 anos. Ditty, chimpanzé fêmea, está conosco há seis anos, seu parceiro Gilberto também, assim como suas companheiras Lulu e Margareth. Elas vieram juntas de um Criadouro Comercial, em Morrete, no Paraná, hoje desativado. Ditty teve duas filhas antes de chegar ao Santuário, Dolores, atualmente com quase 10 anos, e Samantha com oito anos. Ambas também estão conosco, porém nem elas sabem que Ditty é sua mãe, nem Ditty sabe que são suas filhas. Foram tiradas da mãe aos dois dias do nascimento.
Luiza que nasceu há três anos no Santuário foi a primeira filha que Ditty conseguiu criar, e seu pai Gilberto, conhecer e acompanhar o seu crescimento. Na época nós tínhamos medo de que Luiza pudesse ser machucada ao nascer, ou pelo pai, ou pelas tias, tentando disputa-la. Todas as tias também têm uma história de maternidade sem bebês para criar. Margarete teve vários filhos, do que conhecemos com certeza, Gil, recentemente falecida; Noel, hoje com oito anos e meio e Emílio, com seis anos e meio, que estão conosco. Lulu, a outra tia, também teve vários filhos, que nunca conheceu; Mônica, Vitor, Carlos e Cláudio. Todos estão hoje conosco, porém desconhecem a filiação e a maternidade.
Na vida livre os chimpanzés formam grandes comunidades, e têm avós, mães, pais, filhos e netos todos morando juntos. No cativeiro, em parte por perturbações comportamentais de alguns submetidos a abusos e ao isolamento, e outros por falta de filhos, a possibilidade aumenta da disputa pela posse de um bebê novo no grupo. Esse era o nosso medo. Daí separamos a Ditty e a Luiza em um recinto ao lado, em que por uma janela, sem acesso a mãos, podiam acompanhar-se mutuamente. Dois meses atrás, permitimos o contato de mãos e chegamos a conclusão que o risco era pequeno de um acidente.
O relato da Dra. Camila que acompanhou a integração final, e o que estamos agora vendo nesse grupo, da felicidade “das mães”, do pai e da própria Luiza, por poder brincar, ser acompanhada e cuidada por vários adultos, o riso de todos, a felicidade estampada na face, destruiu todos os mitos e temores construídos em nossa imaginação. A importância de um bebê em uma comunidade de adultos é absolutamente importante, e aqueles que duvidam podemos apresentar um exemplo prático e evidente, que o melhor enriquecimento para um chimpanzé é outro chimpanzé, e para adultos é um bebê.
Dr. Pedro A Ynterian
A seguir o relato da Dra. Camila:
A reunião do grupo
A introdução de um chimpanzé em grupo é bastante complicada, devido a formação de alianças e de uma hierarquia que precisa ser respeitada pelo novo chimpanzé. Por isso resolvemos fazer a aproximação com muita cautela, já que Luiza é ainda um bebê. No caso de Ditty, não havia problemas já que ela era velha conhecida de todos e adorada por Gilberto, apenas Luiza era nova no grupo, por isso já estávamos fazendo uma aproximação pela janela do recinto que tem comunicação direta com o recinto do grupo de Gilberto.
Primeiro colocamos em um dos quartos, Lulu com Ditty e Luiza. A primeira reação de Lulu foi de curiosidade e um pouco de medo de Luiza, mas logo já estava brincando com ela e sorrindo, como se estivesse agradecendo a oportunidade de estar perto de um bebê.
Depois foi a vez de Margarete. Dessa vez colocamos Lulu, Ditty, Luiza e Margarete em um recinto aberto, enquanto Gilberto ficou esperando separado em outro quarto. Ditty logo deu um caloroso abraço em Margarete que ficou bastante animada com Luiza que então, começou a se sentir bem a vontade em seu novo recinto, correndo e brincando nas cordas. Lulu continuava se mostrando muito feliz e ficou protegendo Luiza o tempo todo, como uma verdadeira mãe cuida de seu filhote. Ditty que já não estava mais preocupada com sua filha, pois percebeu que não havia mais perigo, foi logo para uma das janelas para ver Luke, de quem ela parece gostar bastante, já que no recinto que ela ficava antes, não era possível interagir com ele.
Finalmente chegou a vez de Gilberto que impaciente, ficou o tempo todo batendo na porta do quarto, para pedir que nós abríssemos para ele sair. Quando abrimos a porta as três fêmeas adultas ficaram um pouco apreensivas, mas em poucos minutos Gilberto percebeu que Luiza estava super protegida pelas três fêmeas e demonstrou até um pouco de medo em chegar perto de Luiza. Aos pouco ele começou a brincar com sua filha e logo matou as saudades de Ditty fazendo “grooming” nela. Lulu, se mostrou realizada e cuidou de Luiza incansavelmente seguindo e observando de perto todos os seus passos, principalmente quando ela estava brincando com Gilberto.
Logo já estavam todos tranqüilos e felizes por estarem juntos, depois de mais de três anos separados, terão a chance de formar uma bela “família” novamente.
Camila Gentile