História do chimpanzé Jimmy no jornal O Globo
postado em 28 dez 2010

Como é a vida do chimpanzé que virou pintor e tem sido alvo de disputa judicial para deixar o zoo de Niterói e ir para um santuário em SP

Por Silvia Rogar

Assim como Picasso, Jimmy teve sua fase azul. Mas a obsessão pela cor já passou. Seu quadro mais recente, à vista numa exposição que terminou ontem na galeria da Aliança Francesa de Icaraí, combina tons que lembram os de um pôr do sol. O Jimmy em questão é um chimpanzé, tem 27 anos, vive no Zoológico de Niterói, nunca namorou e só mata a sede com água gelada. Este ano, atraiu a atenção, até da imprensa internacional, por dois motivos: aprendeu a pintar (sempre com a mão direita) e virou alvo de uma disputa judicial.

Entidades de defesa dos animais são contra a vida que ele leva, longe de seus pares, e pedem que o chimpanzé seja transferido para um santuário que abriga 51 macacos no interior de São Paulo. O grupo de militantes entrou com um pedido de hábeas corpus, alegando que Jimmy, por ser primata, tem os mesmos direitos dos humanos na Justiça.

Em primeira instância, o pedido foi negado, e o destino de Jimmy só deve ser decidido mesmo em fevereiro. Enquanto isso, ele segue em sua jaula de 120 metros quadrados, com uma TV de 21 polegadas em frente às grades sintonizada na TV Globo e uma barulhenta obra nos fundos. Adora jujubas, suco de goiaba em lata e toma, diariamente, uma vitamina de Sustagen. Educado, estende a mão quando alguém se aproxima e faz um barulhinho com a boca – meio beijo, meio cacoete. No publicitário Roched Seba, 25 anos, voluntário do zoo que o ensinou a pintar, adora dar “selinhos”.

-O Jimmy é meio Hebe (Camargo) – diz Roched, que sempre retribui as demonstrações de afeto e não cansa de repetir -Ele não é lindo?

Desde a infância, no Circo Romano Garcia, Jimmy é tratado como gente.

-Meu marido trouxe do exterior três chimpanzés recém-nascidos, mas ficamos só com o Jimmy. Ele tomava mamadeira, usava fralda e dormia numa cama no trailer – lembra Ana Garcia, viúva de Romano, de 80 anos.

Jimmy rodou o Brasil e chegou a ter número próprio: equilibrava-se num arame e andava de monociclo pelo picadeiro. Em 87, Romano e Ana cansaram da vida de saltimbancos, desarmaram a lona e venderam Jimmy ao Circo D’Itália. Ele fez parte de sua trupe até 2000, quando foi doado ao zoológico, depois que o D’Itália também fechou. A partir daí, denúncias via email começaram a chegar às entidades defensoras dos animais.

-Solitário, Jimmy não consegue exercer seu comportamento típico, além de estar sujeito ao estresse das visitações – defende Selma Mandruca, presidente no Brasil do Projeto dos Grandes Primatas.

No Santuário, há chimpanzés que folheiam revistas, assistem a jogos de futebol e pintam, como Jimmy. Com gestos firmes e delicados, seu manuseio do pincel é impressionante. A mostra dos quadros do macaco não foi apenas golpe de marketing.

-A idéia foi questionar o que é arte, o que é um artista – diz, bem à francesa, Nicolas Duvialard, diretor da Aliança.

Jimmy não é o primeiro chimpanzé-artista a ganhar fama. Nos anos 50, Congo, do Zoológico de Londres, tornou-se pintor compulsivo. Salvador Dalí ficou tão surpreso com seus quadros que comparou o animal mais semelhante do homem ao mestre do expressionismo abstrato: “A mão do chimpanzé é quase humana; a de Jackson Pollock é totalmente animal.”

Fonte:
Revista o Globo – 19/12/2010 – Perfil

Legendas:
(A)O macaco, que já passou por dois circos, pinta em sua jaula, que tem até uma TV de 21 polegadas: ele adora jujuba e suco de goiaba em lata. Foto de Marizilda Cruppe.

(B)Pintura animal: dois quadros de Jimmy exibidos numa exposição na Aliança Francesa de Icaraí; ele já teve sua fase azul, agora está multicor. Fotos de divulgação.

Notícia relacionada:

17/12/2010: Julgamento do Habeas Corpus de Jimmy é protelado para janeiro

https://www.projetogap.org.br/pt-BR/noticias/Show/3438,habeas-corpus-de-jimmy-julgamento-e-protelado