Um dos tantos Chimpanzés trucidados pelo egoísmo humano
O Chimpanzé Jerom completaria vinte anos em fevereiro. Ele poderia ter vivido a vida de seus ancestrais, estar agora em uma floresta a beira de um rio, tomando decisões sábias sobre como ocupar seu tempo, ou em uma figueira contemplando a savana, ou perseguindo macacos de rabo vermelho no meio da mata, ou seguindo a um amigo em seu caminhar na floresta. Ele deveria ter se desenvolvido em um indivíduo altivo e bonito, carregando em seu corpo robusto 60 quilos de peso, seu cabelo preto-retinto e sua face escura dando-lhe uma aparência reservada. Ele deveria ter habitado em uma floresta com sua prole, garantindo a sobrevivência futura dos chimpanzés selvagens.
Jerom nunca viveu esta vida – ele foi criado por humanos para que pudéssemos alcançar nosso objetivo inatingível de viver sem doenças. Embora inteligentes e freqüentemente cheio de opiniões, os chimpanzés nunca foram consultados antes de ver suas vidas roubadas para uso em pesquisa médica.
Jerom viveu aproximadamente 14 anos no Yerkes Regional Primates Research Center, um laboratório de origem federal em Atlanta, Georgia. Ele foi tirado de sua mãe quando era um bebê, cresceu como se fosse um órfão e foi experimentalmente infectado com HIV aos dois anos de idade. Quando o encontrei, onze anos depois, ele estava sozinho e morrendo. Ao invés de uma figura altiva, ele estava cabisbaixo e magro, seu pêlo sem brilho, sua pele pálida, seus olhos fundos, tristes e cheios de medo, e com febre. Ele estava desconfiado dos humanos, incerto dele mesmo e frustrado com o destino de sua vida. Sofreu todas as humilhações que um Chimpanzé enjaulado pode sofrer e assim morreu. Para as pessoas que o criaram, seu único valor foi os dados que vieram de seu sangue. Para mim, tudo sobre Jerom foi de valor.
Se Jerom estivesse vivo hoje, provavelmente estaria vivendo sozinho, diante de outros Chimpanzés, com os quais ele nunca seria novamente capaz de conviver. Se ele tivesse vinte anos, teria passado seus últimos dezoito anos trancafiado, sem receber ao menos uma vez, uma brisa fria ou o calor do sol em sua face. Aos dezoito anos ele teria passado todos seus dias em uma gaiola de concreto úmida, tendo como única diversão, fornecida por humanos, um pequeno brinquedo de plástico, ou uma caixa desmontável ou um jornal ou talvez assistir a um desenho na televisão. Ele teria passado seus últimos dezoito anos comendo apenas o que os humanos decidissem e quando decidissem. Suas preferências, gostos ou desejos, pouco interessavam.
Jerom morreu há seis anos atrás, em 13 de fevereiro, libertando-se do tratamento condicionado por humanos no Animal Welfare Act, que se caracteriza, ao nosso ver, por sua crueldade e barbárie, porém não para os legisladores que o aprovou. Jerom talvez teve sorte, dez de seus companheiros ainda vivem esta vida em Yerkes. Dois deles – Buster e Nathan – estão enjaulados sozinhos como estava Jerom há anos. Imaginemos, centenas e centenas de dias sem um toque entre eles, de sua espécie, só enxergando humanos com luvas e roupas especiais, que o tratam com frieza e medo. Os outros oito vivem em pares e trios, mais sofrem as mesmas condições de confinamento e desrespeito.
Buster e Nathan ambos são um pouco mais velhos de que Jerom seria hoje. As razões de seu isolamento e privações são desconhecidas. Nenhum deles desenvolveu sintomas clínicos de AIDS, então é provável que eles não estejam sozinhos por razões de saúde. Pode ser que seja inconveniente para Yerkes devolvê-los ao convívio social que eles imploram.
TODOS OS ANOS eu conto esta história para comover o coração de vocês. Se você está lendo isto por se considerar uma parte da luta pela independência de primatas usados em pesquisa biomédica, continue lutando, eles ainda precisam de você.
Se você leu isto e não se comoveu, permita-me tentar convencê-lo com outra abordagem. Há aproximadamente vinte anos que os Chimpanzés estão sendo usados como elemento de pesquisa biomédica para prevenção da AIDS. Durante todo este tempo, até hoje, nenhuma vacina, droga ou avanços foram logrados como resultado dos estudos com Chimpanzés. Com a possível exceção de Jerom, os Chimpanzés não desenvolveram a AIDS: o vírus age muito diferentemente no sistema imune do Chimpanzé do que no homem. Se você não se importa com eles, tudo bem, considere somente o dinheiro gasto neles, e que poderia ser gasto ajudando a humanos doentes. Milhões de dólares são gastos anualmente para o sustento deles exclusivamente, sem mencionar os gastos realizados na pesquisa, assim como o tempo e energia dilapidados.
Não considere só minhas palavras neste tema. Grupos de médicos em todo o mundo uniram-se para protestar sobre as condições desumanas dos animais nos laboratórios, assim como as premissas científicas imperfeitas, e até erradas, que tem motivado muitas pesquisas biomédicas com animais. Não somente os trabalhos com Chimpanzés estão sendo questionados, existem pesquisas com dezenas de milhares de outros macacos, cachorros, coelhos e outros não humanos, na mesma situação. Você tem que estar preocupado que o sofrimento gerado em cada um destes seres, está diretamente relacionado para atender nossas necessidades médicas, e diretamente ligado aos produtos que consumimos e financiamos com os impostos que pagamos. Em resumo, este sistema brutal e arcaico, produz, quando muito, resultados insignificantes. Avanços tecnológicos agora disponíveis, combinados com estudos epidemiológicos em humanos, assim como casos clínicos existentes, tem provado dar resultados melhores e mais aplicáveis aos humanos.
Considere este interesse médico e econômico, e adicione a ele as dimensões éticas de que estou lhe informando. Então, pense, 200 Chimpanzés inoculados com AIDS desfalecem em pequenas gaiolas de biocontensão, totalmente artificiais e restritivas ao redor dos Estados Unidos. Além destes, tem mais de 1500 Chimpanzés, usados para estudar outras doenças, como gota, hepatite, malária e outras doenças humanas, e que precisam ter um pouco mais de espaço, e viver mais naturalmente, não como vivem hoje, em pequenos recintos de laboratório. Cada um tem uma face, um nome, uma personalidade. Cada um deles foi escravizado porque os humanos decidiram unilateralmente que isso era justo.
O CHIMP ACT (CHIMPANZEE HEALTH IMPROVEMENT, MAINTENANCE AND PROTECTION) aprovado no último ano melhora a vida e alojamento destes primatas, sendo um avanço para os próximos anos. Porém, não é suficiente. Para corrigir os erros, na realidade a pesquisa com Chimpanzés deve parar e a reprodução em cativeiro também. As mortes recentes dos Chimpanzés Pablo e Annie, residentes queridos da Fundação Fauna, o único Santuário para Chimpanzés no Canadá, provam que temos que fazer mais. Pablo e Annie não eram indivíduos velhos, os últimos 4 anos no Santuário não conseguiram apagar e compensar a década de sofrimentos em pesquisas biomédicas. O impressionante sobre suas autópsias foi o grau de aderências em seus órgãos internos, produtos de dezenas de anestesias nos processos médicos.
Dar aos Chimpanzés em laboratórios gaiolas maiores, possibilidade do ar livre, viver em grupos sociais, escolha de alimentos e de fazer exercícios livremente é um passo, porém não é suficiente. Eles merecem respeito e não merecem viver a serviço dos humanos. A única coisa que eles nunca terão em cativeiro é liberdade completa de escolha, que é o que define uma pessoa verdadeiramente livre. E eles são pessoas – não humanas porém pessoas – e nós não estamos fazendo nada por eles, ainda os usamos para nos servir, como se tivéssemos esse direito. Eles tem direito a ter uma vida digna e livre da opressão. Suas vidas não nos pertencem , pertencem a eles, e não somos nós que devemos decidir o que fazer com elas, mas sim eles.
A pesquisa médica foi longe demais, tomou vidas valiosas, na idade em que estariam em sua plena vitalidade. Aqui alguns deles:
MANUEL: Interno de Yerkes, HIV positivo, foi em algum momento amigo de Jerom, morto de causas
desconhecidas, em 17 de abril de 2001, com 22 anos de idade;
SONIA: Interna de Yerkes, morreu de falência múltipla de órgãos em uma pequena jaula, sem sua família,
em 05 de junho de 2001, com 42 anos de idade;
GINA: Interna da Coulston Foundation (Laboratório no Estado de Novo México), morreu de superexposição
ao sol e calor quando estava em uma gaiola fora do recinto, em 05 de junho de 2001, com 12 anos de
idade;
SELLERS: Interno de Yerkes, morreu acidentalmente de estrangulamento durante um estudo de gota, ao estar
sozinho e sem supervisão em uma gaiola pequeníssima, em 11 de junho de 2001, com18 anos de idade;
PABLO: Residente da Fundação Fauna, morreu de aderências e excesso de tecido interno cicatrizado, devido a
anestesias constantes, em 06 de outubro de 2001, com 31 anos de idade;
ANNIE: Residente e matriarca da Fundação Fauna, morreu de gangrena do intestino e saúde fraca generalizada,
em 10 de janeiro de 2002, com 42 anos de idade;
KOEN: Interno do laboratório alemão BPRC, HIV positivo, morreu por causas desconhecidas, em 29 de
janeiro de 2002, com 28 anos de idade.
Estes são apenas aqueles Chimpanzés com amigos humanos que os acompanharam para contar suas histórias. Sem dúvida, existem muitos outros. Em memória a todos eles, assim com o pesar de dois bebês que foram recentemente tirados de suas mães na Coulston Foundation, para serem vendidos à indústria do espetáculo, e aqueles participantes obrigados do Projeto AIDS de Chimpanzés no Yerkes – Buster, Nathan, Arctica, Joye, Betsie, Jonah, Marc, Roberta, Tika e Hallie: Queremos lembrá-lo neste momento, assim como pedir para recordar-se de Jerom.
Por favor, escreva para Stuart Zola – Diretor do Yerkes: 954 Gatewood Road
Atlanta, GA 30322
USA
Phone: (404)727-7844
E-mail: szola@emory.edu
Diga-lhe que você se preocupa com os Chimpanzés desta Instituição e que deseja uma explicação sobre o tratamento aos quais são submetidos.
Rachel Weiss
13 de fevereiro de 2002.