“Autoridades” disfarçam problemas
postado em 26 dez 2007

Varrer a sujeira para debaixo do tapete é uma prática corriqueira no Brasil. Ao invés de se buscar soluções para os problemas as “autoridades” acham mais fácil disfarçar o problema, sem tentar chegar à origem.

Isso se vê quando algum chefe de estado vem visitar o país. Mendigos são retirados das ruas, faz-se acordo com traficantes para evitar conflitos, o caminho por onde a comitiva ira passar é limpo e arrumado. Mas por trás desta fachada a pobreza, a violência e a falta de infra-estrutura continuam as mesmas.

Infelizmente não é diferente na área ambiental. Esta semana em Fernando de Noronha o IBAMA está matando cerca de 900 garças que estariam ameaçando a segurança dos aviões. Não se questionou o porquê do desequilíbrio desta população e nem o fato de a principal área de concentração dos animais ser o aterro sanitário construído ao lado do aeroporto. É mais fácil e rápido varrer a sujeira para debaixo do tapete. Mata-se 90% da população de garças da ilha e resolve-se o problema. Quando a população voltar a crescer (e vai voltar) é só realizar a matança outra vez! Não se cogitou em acabar com a oferta de alimento no aterro, transferi-lo para longe do aeroporto ou usar métodos anti-conceptivos para controlar a população das garças.

Em Uberaba acontece a mesma coisa. Durante anos os macacos Chico e Chica viveram no que resta da Mata do Ipê.  Ao longo dos anos a mata veio sendo destruída pela especulação imobiliária, a cerca que deveria isolar a mata está caída e já ocorreram tentativas de estupro e uso freqüente de drogas dentro da mata. Não existe um trabalho de educação ambiental na mata. Os visitantes chegam e não tem nenhuma orientação. Não há placas e nem guias. O lixo é jogado em qualquer lugar.

Foi nestas condições que Chico foi criado. Visitantes e funcionários ofereciam comida para ele, pegavam ele no colo, brincavam, ofereciam objetos para ele segurar. Chico cresceu e passou a achar natural comer o que lhe ofereciam, pegar celulares e reagir como outros macacos quando desafiado, com ameaças e mordidas.

De um ano para cá Chico passou a ser acusado por todos os males que ocorrem em Uberaba. Chamam-no de ladrão e agressor, mas se calam diante da violência urbana.

Fecharam a mata para evitar novos casos de agressão, mas não foram efetivadas as solução propostas. Não se implementou a proposta de monitores para guiar os visitantes e também ensinar, ou condicionar os “pregos” à não ultrapassarem os limites das cercas. Este trabalho poderia ser feito com adolescentes carentes, ou estudantes com objetivo de auxiliar na formação e capacitação dos mesmos. Estes monitores conduziriam os visitantes, ensinariam como se comportarem diante dos animais, evitando assim agressões por parte do Chico e fariam um trabalho de educação ambiental. 

O muro de proteção no fundo da Mata até agora não foi feito, permitindo que marginais possam adentrar livremente, ao invés disso iniciou-se a reforma dos sanitários.

A mata continua sem um plano de manejo, sendo que várias reuniões foram realizadas e no minuto seguinte todo o plano esquecido! Trilhas são abertas sem critérios, a erosão toma conta das trilhas e o lago esta assoreado. Cortes de árvores foram feitas criminalmente sem licença do COPAM ou do COMAM. Não existe planejamento, não existem medidas para se prevenir incêndios na época da seca, não existe educação ambiental. Tudo isto é esquecido. O único problema da mata é o Chico, a ponto do responsável pelas Matas de Uberaba, o Subsecretário da Secretaria do Meio Ambiente garantir que “O Chico saindo, no outro dia estaremos com as portas do parque abertas”.

Surpreendente que o subsecretário e seu técnico biólogo, ambos sem  informação, imaginem que o macaco-prego seja um animal que não ocorra em nossa região, que Chico não desempenhe um papel como dispersor de sementes na mata. Ele parece esquecer que a mata do Ipê é uma Unidade de Conservação (UC) e merece ser tratada como tal. Porque retirar uma espécie nativa da mata e deixar espécies exóticas como os pavões?

O subsecretário demonstra ausência de sensibilidade e conhecimento sobre a Natureza ao relatar ao jornal que “Na Mata, não há mais possibilidade de o Chico ficar. O espaço ficou pequeno e, tornou uma espécie de macaco “urbanóide”,. Quer beber e comer o que a gente come…isso não pode continuar”. O próprio subsecretário há tempos vêm apoiando e emitindo ordem para o corte de árvores e ampliação de áreas desmatadas na mata. Ele esquece que Chica, a fêmea, nunca ocasionou um problema e é a prova que os macacos podem sim conviver no que ainda resta da mata do Ipê.

Temos que extinguir não os macacos-prego mas sim os “primatas hipócritas” que ocupam cargos públicos e decidem o futuro da natureza baseado em suas próprias convicções sem respeitar à construção coletiva de uma visão biocêntrica, único caminho para que Homem e Natureza possam conviver em harmonia.

Não podemos deixar a sujeira ser novamente varrida para debaixo do tapete. Chico será expulso de sua casa. Levado “temporariamente” para um cativeiro em Araxá.

Prometem que um recinto adequado será construído e que em 2 a 3 meses ele voltará a viver na mata do Ipê. Resta perguntar se vocês acreditam também em papai Noel?


Érica Assunção Araújo
Coordenadora do Grupo de Estudos de Animais Selvagens de Uberaba/ GEASU
Estudante de Medicina Veterinária
Ambientalista de natureza


Notícias do GAP 26.12.2007