SANTUÁRIO DE SOROCABA
Jimmy chegou de noite e da caixa de transporte passou para um túnel aéreo que o levou ao seu dormitório. Ainda sob efeito das seqüelas da anestesia, necessária para colocá-lo na caixa de transporte, ainda andava sem segurança. De manhã já estava melhor. No primeiro dia no Santuário, havia muitos profissionais de imprensa na área e ele ainda estava assustado. Às 10 horas da manhã do dia seguinte, abrimos a porta para a parte externa do recinto dele. Pela primeira vez Jimmy colocou os pés na grama, talvez até pela primeira vez em sua vida. Ele andou devagar, correu os mais de 3.000 metros quadrados do seu recinto, que tem duas áreas fechadas, uma com cobertura e três andares, e plataformas altas para deitar.
Em seu olhar sabíamos que ele não estava acreditando ter saído daquele “gaiolão” miserável onde viveu por mais de 10 anos, e estava numa “casa” decente, que lhe permitiria correr, brincar, pular e fazer todos os exercícios próprios de sua espécie. Rapidamente percebeu que no recinto do lado tinha companhia, talvez também a primeira vez em sua vida que enxergava de perto uma chimpanzé jovem, Samantha, e sua filha Sofia, de 2 anos, que morria de curiosidade para conhecê-lo.
Nas primeiras 24 horas, Jimmy nunca andou tanto. Deve ter percorrido os 3.000 metros quadrados mais de 10 vezes, sua quota de caminhada de um ano no “gaiolão” em que viveu, onde andava em círculos. À tarde já mostrou que seu apetite tinha reaparecido, comeu frutas, tomou iogurtes e sucos. Ele já estava começando a acreditar que aquilo não era sonho, como tantos não realizados que ele teve em sua vida sofrida.
No dia seguinte, já com 48 horas no Santuário, Jimmy correu pela primeira vez, talvez também a primeira vez que conseguia correr em algum lugar. Foi à janela e deu um beijo em Sofia, que lhe deu as costas em sentido de amizade. Começou a desenvolver uma rápida e extraordinária curiosidade por suas vizinhas. Entrou no refeitório e me pediu que abrisse o túnel para juntar-se a elas, mas isso não é possível no momento, pois o procedimento de aproximação vai demorar um bom tempo até termos certeza de que será seguro e que a perturbação mental que ele padece – adquirida naquele Zoológico absurdo – não vai afetar o seu relacionamento com outros chimpanzés. Rezemos para que assim seja. Jimmy precisa desesperadamente de companhia de outros chimpanzés para não enlouquecer para sempre.
Dez anos atrás, o Dr. Miguel Vaudano, do Projeto GAP, entrou no Zoonit e tirou as primeiras fotos daquele local aterrorizante. Com a colaboração da ambientalista Andréa Lambert, tivemos acesso à documentação de entrada de animais naquele Zoológico. Rapidamente comprovamos que algo “esquisito” estava acontecendo lá; entravam centenas de animais “resgatados” que mais tarde desapareciam. Fizemos a denúncia ao Ibama, assim como dos maus tratos aos animais. Dez anos depois a Justiça se fez. O Zoonit foi fechado, Jimmy e seus companheiros de infortúnio agora vão desfrutar de uma nova vida. O relato que recebemos do Analista Ambiental do Ibama, Carlos Abreu (que participou da operação de esvaziamento final do Zoonit) é um nítido e cru testemunho do que lá acontecia, frente a uma sociedade humana ignorante e omissa, que freqüentava o zoológico e nunca se tocou em pensar que centenas de seres inocentes eram lá trucidados, como na maioria dos zoológicos brasileiros e mundiais, e ninguém se revoltava ou pedia um BASTA àquela insensatez.
Dr. Pedro A. Ynterian
Presidente, Projeto GAP Internacional
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